terça-feira, dezembro 18, 2012

Cadernos de Viagem II



Uma viagem de avião que demora 8 horas é basicamente um domingo de ressaca. Sofá, filmes maus e comida pior.

Sentamos inanimados ate que os ossos doam. Há almofada e manta e monitor e o controlo da programação. É sentar e descontrair.

Nesta viagem sentou-se a meu lado um casal português. Idosos, retornados de uma via inteira de trabalho no estrangeiro, iam de visita aos filhos. Ambos largos, americano XXL, grisalhos e com ar de vizinhos do lado.

Na América deviam ser os portugueses numa qualquer comunidade perdida do Connecticut.

Devo ter este ar complacente, as pessoas falam comigo, não porque querem conversar, mas porque querem falar, ouvir-se. Querem que alguém lhes acene com a cabeça num gesto de concordancia, mesmo que seja um simples acto de simpatia, apenas e só. Uma condescenencia.

Este retornado e dos arrependidos, um daqueles que continua a viver o sonho americano. Portugal e apenas aquele pais perdido onde tudo vai mal.

A conversa não ia mal, mas o velhinho grisalho era algo xenófobo e ate racista...o que me desconsertou. Como pode alguém que viveu toda a sua vida sendo sendo estrangeiro num outro pais pensar assim?

Todos os outros emigrantes tinham algo de errado e eram o mal daquela grande nação...ser português e então uma espécie de posto, que maus são os de Porto Rico, ou os pretos...

Eu sou condescendente, podia dizer-lhe o quanto me parece estranha essa posição. Mas quem sou eu, não sei, não vi. Ouço e analiso. No mundo há gente que pensa de tudo.

Num avião desses, em que vamos emparedados em bancos de três, as horas são lentas e o tempo imperceptível num fuso horário sempre em mutação.

Há sol por cima das nuvens. Um mar delas brancas a perder de vista e um eventual rasgo de azul a lembrar que la por baixo há uma imensidão de oceano. Horas de vazio, sem chão em que e melhor não pensar.

Entre filmes e series e musica o tempo passou pesado no corpo. Chegar a Newark foi um alivio. Newark e um aeroporto a perder de vista. Com comboio que nos leva entre terminais. De noite, na partida o mar de luzes e lindo, organiza aquele transito de aviões em linha para partir. Como numa qualquer estrada.

O café era mau, o WiFi não se deu com o meu samsung e havia gente, muita gente pelos corredores.

Não consinto no meu dia-a-dia ver tanta gente junta. De tantas cores e feitios. As malas que trazem, as roupas que vestem. Pequenos pormenores que nos denunciam, que nos permitem adivinhar de onde vem. Os gestos largos ou discretos, um ligeiro sotaque no inglês, ou talvez um apenas traço tao especifico na fisionomia. Esse ar latino ou chinês que os trai nas filas da alfandega e da problemas na imigração. Ter um ar ocidental, limpo, europeu ajuda. Ninguém me deu outra coisa que não sorrisos. Ninguém fez perguntas desnecessárias ou revistas inapropriadas. Mas e longo o processo, de fila em fila, decalça os sapatos, calça os sapatos, passa no detector de metais vezes sem conta. Oferece sem mais as tuas impressões digitais completas para as bases de dados do FBI e entras. All Clear.

Exausta por fim, a caminho de Montreal num mini-avião da embraer, que parte atrasado e treme, Meu Deus treme com a turbolencia.

Num daqueles tremores que nos lançam o estômago no vazio e nos da uma vontade inédita de rezar.

Quando se avista a linha da costa de Montreal e já outro dia em Portugal.

A cidade imensa por debaixo de nos, as luzes a perder de vista um sabor a natal nos prédios.

Avista-se o Old Port que morre numa cortina de mar gelado.

Ve-se neve pelos parques e são brancos os jardins.

Começa assim a viagem. Neste dia tão longo que não há memoria. Com esta admiração pelo mundo, com todas estas imperfeições, com as pessoas, cada pessoa sendo um mundo em si.

Há momentos na vida que nos deixam assim, a sentir que no fim de tanta turbolencia, o melhor esta mesmo para vir.





P.S. A falta de acentos e outros erros devem-se ao desconhecimento do modo de funcionar deste Macbook. Mas vou trabalhar nisso!

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