domingo, março 30, 2008

"O Arrependido" (1947)

“…Kathie está por cima e tem o dinheiro. Num tom clássico de mulher-aranha , no género de Phyllis Dietrichson em Pagos a Dobrar, ela toma conta da situação: «Nunca a disse que era algo que não era. Tu apenas o imaginaste.»…”
in Film Noir de Alain Silver & James Ursini / Paul Duncan (Ed.) editado pela Taschen





“O Arrependido”, título português para o filme “Out of the past” é mais uma história em o homem, atormentado pelo seu passado isola-se numa pequena localidade e tenta mudar de vida criando para si um novo um mundo.
Mas no mundo do Noir não há lugar à expiação dos males nem à auto-comiseração.
O passado encontra-nos sempre e envolve-nos com uma nuvem negra.
Jeff Bailey (Robert Mitchum) é um antigo detective que se apaixona pelo alvo da sua investigação. Kathie é tão bonita como manipuladora e perigosa. E apesar deste saber que está a entrar num caminho sem retorno não consegue resistir-lhe.
Kathie Moffat (Jane Greer) é a femme fatale, de trejeitos e inocentes e esgares de malícia. È a dominadora, o motivo impulsionador da desgraça inicial e o fio condutor até ao final trágico anunciado.
Em “O Arrependido” tal como em “Pagos a dobrar” o despoletar da história é esta femme fatale à qual o homem não pode resistir.
Existe quase um tom fatalista, pois tanto Jeff Bailey como Walter Neff sabem que estão a ser usados. Mas estão como enfeitiçados, nada os consegue deter nesse caminho que só poderá ter um final.

“Kathie Moffat: I think we deserve a break.
Jeff Bailey: We deserve each other.”

Tal com em Pagos a dobrar, as personagens chegam ao fim da linha. Jeff Bailey ,tal como Walter Neff, percebe que é tão culpado do seu destino como a sua musa e que no fundo se merecem.

Parece-me óbvio a analogia entre os dois argumentos. Apesar das personagens e os seus motivos serem diferentes. Em “Pagos a Dobrar” Walter Neff entra conscientemente num esquema que ele próprio imagina, ele é motivado não só pela procura de dinheiro fácil, como pela atracção hipnótica que sente por Phyliis e pela vontade de bater o sistema encarnado no seu amigo Barton Keyes. Já em o “Arrependido” Jeff deixa-se levar para uma história que ele não conhece. Coloca-se nas mãos de Kathie desde o primeiro momento dizendo-lhe: “Descobrirás como é muito fácil levar-me para qualquer lado.”

No entanto não é usual que seja a figura feminina a má da fita, o génio calculista que desde o inicio se prepara para manipular todos os que estão à sua volta.

Gostei imenso dos dois filmes, enquanto argumentos, enquanto imagem estética criada pela fotografia a preto e branco brilhante e pelo desempenho dos actores.
Descobri com este “O Arrependido” Robert Mitchum. O DVD tem ainda um curto documentario que faz a retrospectiva da sua carreira. Um nome a recordar.


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