quarta-feira, abril 06, 2011

Viver a crise


Quando eu era adolescente, nos finais da década de 90 e inícios dos anos 2000, vivíamos numa espécie de euforia. Havia tudo e previa-se que haveria mais.
Na primeira viagem que fiz para Portalegre para vir estudar - tinha então 18 anos e um carrito em segunda - mão prenda pela maioridade - um litro de gasóleo custava pouco mais de €0.70. Viajar era então barato.
Beber copos era barato. Comer era barato.
As propinas custaram no primeiro ano o valor simbólico de €300 para custarem hoje em dia - e para um curso que tem menos 1 ano - o triplo!
Havia no ar essa sensação de possibilidade. Coisas podiam acontecer, as pessoas poderiam aspirar a evoluir, a vida só poderia correr para a foz como o curso de um rio.

Mas em 2006, quando eu acabei o curso já as bases da nossa sociedade começavam a tremer perante a precariedade, o aumento gradual do combustível, embora ainda não estivéssemos prontos para o ver, as ondas de choque deste terramoto sociológico começavam a fazer-se sentir.
A certeza de que o curso me proporcionaria um emprego estável estava já por essa altura perdida e desde ai que o cenário apenas se tem vindo a degradar.

Não arranjei por essa altura um desses emprego de sonho. Um lugar estável, um salário agradável, férias no Verão e no Natal e muita paz de espírito.
Fiquei para trás. Primeiro com um estagio profissional, depois com um ano de trabalho em situação precária e frustrante e depois comecei a achar que podia ganhar tudo isso à força de querer e há quase três anos a trabalhar contra a corrente.

Enquanto todos os outros foram fazendo as férias da neve, as idas de fim-de-semana alargado a París, ou as compras da estação eu fui ficando para trás pensando que haveria compensação para o meu esforço. Acreditando que um pouco mais há frente haveria compensação para o esforço.
Seria isso ser empreendedor. Trabalhar primeiro, ser recompensado depois.

Mas ai veio a crise em cima da crise. E chegamos ao final do primeiro trimestre de 2011 com a alma esfarrapada.

Sabemos o que não temos agora, mas pior que isso, sabemos de antemão o que não teremos daqui a um mês. No próximo semestre ou até aquilo que não teremos no ano que vem.

Viver a crise é bem mais do que os cortes e reajustes que temos de fazer na nossa vida quotidiana.
É a terrível amputação dos sonhos e das aspirações. É a morte da esperança de se fazer melhor ou de se concluir o nosso propósito.

Viver a crise é neste momento a perpetuação de um grande "fado" que rola na nossa mente e que parece nunca mais se calar.

Não temo pelo que não tenho agora.
Temo sim por um futuro que não vou ter.

2 comentários:

My One Thousand Movies disse...

Eu sei como é. Já passei por tudo isso, excepto andar na universidade. :(

My One Thousand Movies disse...

Eu sei como é. Já passei por tudo isso, excepto andar na universidade. :(