terça-feira, julho 24, 2012

De volta ao Noir: The Blue Dahlia (1946)


The Blue Dahlia não é um filme notável.  Pelo menos quando o comparamos com outros escritos por Raymond Chandler, autor de “The BIg Sleep” ou de “Double Indemnity” .
Mas é um belo Noir, nas suas sombras, nas noites de chuva. Nas personagens atípicas e até mesmo na sua vítima. Uma mulher.

Mais que não seja, vale a pena ver porque tem Verónica Lake  e os mitos merecem a devida vénia.
Das muitas imagens dos tempos áureos de Hollywood que nos povoam a mente, Veronica Lake é uma das que sobressai.
O seu olhar lânguido, misterioso e longínquo, os cabelos louros, um misto de perigo e de charme. Tudo na sua imagem parece dizer “You know  I’m no good.”, mas essa aura é no entanto irresistível.
O protótipo da Femme Fatale.
A essência do Noir.



sexta-feira, julho 20, 2012

Correr de noite...



"Correr de noite, tornou-se assim numa experiência sem paralelo. De noite o silêncio da cidade é ritmado pela nossa respiração e apenas perturbado pelos latidos longínquos de uma qualquer matilha invisível de cães.
De noites os espaços são amplos, vazios. 
As estradas são largas, as sombras longas, as estrelas luzes. 
A brisa é fresca... as pessoas apenas vultos, a imaginação livre. 
A cidade pulsa apenas ao nosso ritmo, a cada passada sonoramente dada sobre o alcatrão.
De noite acharam todos que somos ainda mais loucos, perdidos, algum tipo de assombração galopante.
Ainda que não haja a energia do sol, a sinceridade do dia, correr de noite é um mundo oculto de coisas a descobrir. 
Mais que física, uma experiência sensorial."




Sobre o pecado...


"Adão sozinho não pecou. Acrescente Eva, e acrescente a tentação. Acrescente um segundo homem e torna o adultério possível. Com a adição de sexo ou pessoas, acrescenta-se o pecado. Se os homens não tivessem braços, não poderiam estrangular com as mãos. Não existiria esse especifico pecado de assassínio. Acrescente braços e acrescenta a possibilidade de uma nova violência. As amebas não podem pecar porque se reproduzem por fissão. Não cobiçam companheiras nem se assassinam umas às outras. Acrescente sexo às amebas, e braços e pernas, e terá assassínio e adultério. Acrescente um braço, ou uma perna, ou uma pessoa, ou retire qualquer delas, e acrescentará ou subtrairá possível mal. Se em Marte houver cinco novos sentidos, órgãos ou membros invisíveis cuja existência não podemos conceber... não poderá consequentemente haver cinco novos pecados?

Bradbury, R. "Crónicas Marcianas"

quinta-feira, julho 19, 2012

Autobiografia do mês de Julho.




O mês de Julho, esse híbrido entre as férias e o trabalho.

Dias quentes entre noites frescas, ondas de calor no alcatrão e essa sensação de possibilidade.
Em Julho coisas podem acontecer.

Como em 2007,  que fui ao Festival Músicas do Mundo de Sines.

Apaixonei-me pelo "Amor em Tempos de Cólera" e pela "Crónica de uma Morte anunciada" de Gabriel Garcia Marques. Vi o "Scoop" do Woody Allen e um Noir antigo, "Gilda" e um Noir pós-moderno "A Dalia Negra."

Ou como em Julho de 2008 em andava cheia de opiniões sobre a imprensa regional, e vi cinema independente, a "Estação" e "The Savages" ou o "Breackfast on Pluto". E vi o blockbuster "Iron Man."

Li a "Desgraça" de J.M. Coetze.

Ouvi The National e P.J. Harvey.


No Verão de 2009 só via a Revista, a minha vida era a Pormenores, o meu blogue o espelho disso.

Julho de 2010 teve Sines novamente. Vi Céu e Saff Benda Bilili... Vi o "Breakfast at Tiffany's", reli o "Orlando" da Virginia Wolf e empolguei-me com a série Millennium nas páginas de "Os Homens que Odeiam as Mulheres".

Vi o "Sexo e a Cidade", o "Robin Wood", "Rachel Get Maried"... Ouvi Morphine.

No ano passado só havia olhos para a horta. Para os meus morangos, para as saladas de tomate e para as alfaces.

Nesta espécie de autobiografia dos meus meses de Julho, revivi cada página de livros que me apaixonaram. Sentei-me de novo no cinema saltando da cadeira a cada susto, ecoaram na minha mente acordes de musica.

Recordar permite-nos isto. Montar um puzzle feito de inúmeras peças que explica o nosso caminho.

É olhar para trás e sentir que afinal houve vida.

É olhar para a frente e imaginar o muito de vida que ainda há para viver.

O tempo continua ainda a ser um mistério para mim, essa ilusão. A inevitabilidade do tempo, dos dias que passam... a perda constante.

Fazer este exercício é sentir que atrás de si o tempo deixa um rasto de memórias..a sua personificação, algo que é quase palpável... não o tempo em si, mas uma memória dele.

quarta-feira, julho 18, 2012

O tempo...


"No ar daquela noite havia um cheiro a tempo. Sorriu e aprofundou mentalmente a ideia. Ali estava um pensamento. A que cheirava o tempo? A pó, relógios e pessoas. E se uma pessoa pensava  a que soava o tempo, soava a água a correr numa caverna escura, a vozes a chorar, a terra a cair em tampas arqueadas de caixas e a chuva. E, indo mais longe, como parecia o tempo? O tempo parecia neve a cair silenciosamente num quarto escuro, ou como num filme mudo num cinema antigo, cem milhões de caras a cair  como aqueles balões do Ano Novo, a cair, a cair em nada. Era assim que o Tempo cheirava, parecia e soava. E naquela noite - Tomás pôs a mão fora da janela, ao vento - quase se podia tocar no tempo."

Bradbury, R. "Crónicas Marcianas"