Lembrei-me de cortar o cabelo, como acontece umas quantas vezes por ano, porque o tédio de olhar no espelho e ver-me com um ar sempre igual lembra-me que existem outras possibilidades.
Então chegas com um ar inseguro, sentas-te e desfolhas as revistas da moda enquanto vozes de mulher se misturam com o bafo quente do secador, e em instantes perdes-te no mundo irreal do “Será que me ficava bem este”, e a verdadeira história da vizinha do lado que se meteu com o outro da porta da frente.
A verdade é, cabelos demasiados compridos estão “démodé”, são resquícios de outros tempos em que se faziam longas tranças e apanhados. Não, ninguém tem mais paciência para os deixar crescer.
Os cabelos curtos são mais actuais. Se bem escolhido pode dar à mulher um ar mais seguro de si, mais autónomo. Acho que também ainda umas ideias vindas da altura da emancipação da mulher.
Pareceram-me a melhor opção. Entre o mundo de cortes, de cores, a direito, escadeado, esfarrapado, sei lá qual escolher!
O corte curto, direito, clássico, anos vinte...
Parece que o brilho das coisas nas revistas nos enchem os olhos, e depois, depois do trabalho feito olhas no espelho e pensas: “Mas que bela porcaria foi eu fazer!”
Mas o cabelo cresce. O tempo passa, a imagem do espelho volta a incomodar-nos e nós voltamos a sentar-nos naquele banco de cabeleireiro, voltamos a confundir a realidade com o brilho do corte de cabelo dos outros e voltamos a fazer asneira outra vez.
E nós a mulheres fazemos isso enumeráveis vezes com tudo o que achamos que pode fazer da nossa imagem única e pessoal. No fim conseguimos apenas ser iguais às outras todas.
Quantas peças de roupa já comprei que depois não vesti, mas na loja pareciam lindas. E os brincos, as malas, os sapatos e todas as demais futilidades que encontramos para usar.
Triste sina. Era bem mais fácil ser-se simplesmente simples. Entrar e pedir: “Corte-me o cabelo, simples a direito.” Sair simplesmente de lá e olhar no espelho e pensar: “Não é nada de especial, mais simples não podia ser. Não fica bem nem mal.”
Mas o raio das revistas têm de lá estar. E lá começa a imaginação a correr e no fim fazemos trapalhada, compramos a roupa errada, maquilhamo-nos demais. E a nossa imagem, aquela que queríamos que fosse pessoal e intransmissível, aquele que havia de marcar a diferença só por si e apenas igual ao da moça da mesa ao lado no café.
Também é verdade que o nosso eu não é aquilo que se vê... Mas o que se vê é uma parte desse eu.
Por isso mais vale simples, a direito, na cor natural e sem enfeites nem artifícios. Porque assim não fica bem, mas também não fica mal...
Sem comentários:
Enviar um comentário