segunda-feira, novembro 27, 2006


Toda a vida isto, esta culpa de querer ser diferente, de querer ser livre. Esta vontade de mandar parar o autocarro, descalçar os sapatos e correr pelos campos molhados e sentir o vento frio no rosto.
Sempre esta vontade oprimida de poder ser eu a decidir, de decidir e ser responsável pelas minhas decisões. Nunca fui, nunca me deixaram decidir.
Sempre esta culpa de querer fazer, mas não o fazer porque isso iria ferir esta ou outra pessoa, sempre esta merda de situação familiar, de contingências, de deveres, de não poder melindrar as esperanças que depositam em nós. Sempre algo primeiro, porque não temos condições financeiras, porque é o nosso pai, porque temos sonhos e não os podemos realizar sozinhos, e ninguém nos está disposto a ajudar assim, desinteressadamente, há sempre um “payback time”.
Cansei. Cansei de viver contrariada, de não poder, de não fazer, de não decidir, de ter medo de que se descubra. Cansei da adrenalina da clandestinidade, das falsas verdades, das meias verdades, das verdades disfarçadas, deste mundo que eu criei para disfarçar a minha incompetência em gerir a minha vida, a minha incompetência em decidir por mim, a minha fraca auto-estima, o meu medo! O medo enorme que sempre tive de ser eu, desta maneira que sou, de perder, de errar, de não sei, simplesmente de não estar certa.
Agora estou a largar-me ao vento, estou a cortar estas amarras, a deixar cair estas âncoras, este sufoco que sempre me prendeu a vida.
Fiz muita asneirada pelo caminho, na procura deste momento enganei-me muitas vezes, mas desta vez sinto-me leve, sinto-me livre, desta vez o que acontecer será só minha responsabilidade, será só a minha opção, serei eu a dar contas a mim e aqueles que amo.
Ficam coisas para trás, ficam coisas caídas no chão, outras dores, outras raivas, mas não são minhas, não vão ser mais. ..

1 comentário:

Rodrigo Maceira disse...

Algumas passagens são excepcionais. "Cansei da adrenalina da clandestinidade" - duvido que haja quem discorde. Não sei se é quando vamos lá embaixo, ou lá para cima: existe um lugar no texto que é comum a quase todas as pessoas. Esse é o sentido da escrita: absorver um hipotético "sentimento do mundo". Besos!