Tenho lido e ouvido as mais variadas coisas sobre a suposta guerra de gerações que circula por ai, nas redes sociais, nos jornais e nas mesas de café.
Tenho engolido em seco algumas afirmações da velha guarda, mas também me tenho envergonhado com algumas posições da “geração à Rasca”. Parece-me que o desespero tolda o bom senso e de ambas as partes têm surgido excessos.
Posso até perceber a revolta perante palavras como as que surgiram no Destak, mas também respeito, e muito, a liberdade de expressão porque os nossos pais lutaram há três décadas atrás.
Aceito que há quem não viva no mundo real e por isso faça leituras desfasadas daquilo que se passa bem debaixo do seu nariz. Acredito até, que no fundo, esse é o problema mais profundo da nossa sociedade. Sempre fomos geridos e guiados por pessoas que cresceram, estudaram e que continuam a viver num outro Portugal. Num Portugal ainda feito de feudos, de nomes de família, de motorista para os ir buscar à escola e de uma total ignorância perante o que se passa para além dos bairros cosmopolitas e tão primeiro mundo de Lisboa. Temos elites pobres de espírito, iletrados sobre o mundo que os rodeia.
Temos elites que não conhecem Portugal.
Que não sabem como se vive no interior ou nos bairros periféricos de Lisboa. Que não conhecem um Portugal de terras produtivas mas abandonadas ou das cidades pequenas e acolhedoras sem moradores. Que não sabem o que é morrer numa ambulância porque fecharam o hospital…
E conhecem menos ainda um Portugal com jovens que querem trabalhar, mas que o querem fazer fora dos grandes centros urbanos. E que nem estão à espera que alguém lhes dê emprego, criam coisas. Mas que se vêem a braços com uma carga fiscal impossível de aguentar, que têm de pagar IVA de facturas não recebidas e que imploram ao telefone para que as entidades lhes paguem serviços realizados há meses…no ano passado.
Compreendo as controvérsias dos recibos-verdes, do trabalho precário e da ilusão a que muitos de nós fomos induzidos ao terminar o ensino superior, ilusão que nos foi incutida pelos nossos pais, pelas escolas e pela sociedade em geral. E sei que não basta uma licenciatura para se saber fazer ou para merecer um lugar ao sol.
Mas não me venham falar de empreendedorismo, esse novo conceito que inventaram para culpabilizar todos aqueles que não encontraram uma saída no mercado de trabalho. Temos de ser empreendedores. Temos de ser pró-activos. Temos de procurar, oferecer, trabalhar por menos, quem sabe - e muitos de nós estamos nessa situação - pagar para trabalhar.
Porque meus senhores, eu pago para trabalhar. Pago a segurança social, mesmo que ninguém tenha tido a decência de pagar a ultima factura enviada.
Pago o IVA dessa factura. E se não o fizer no dia estipulado pago uma multa em cima.
Pago a luz, a Internet e a renda de um escritório, mesmo que não consiga encontrar trabalho para fazer.
Pago todos os dias o peso de ter sido empreendedora com os sonhos adiados, com a dependência dos pais, e com a frustração de não conseguir mais nem melhor, de falhar a cada dia que passa o objectivo de ser autónoma e financeiramente independente.
Algo está errado neste país. Não me venham dizer que é a Geração à Rasca que é mimada e não quer um trabalho mas sim um emprego…
Talvez seja a geração que sempre teve empregos em vez de trabalho que deva reavaliar as suas percepções do mundo, sair dos escritórios e ver o tanto de Portugal que há para ver, o tão grande potencial humano que é desperdiçado todos os dias, o tanto de terra que há para trabalhar. E tanta gente que só precisa de uma oportunidade.
1 comentário:
Minha querida, estou neste momento a aplaudir-te de pé!
Um grande beijo e abraço maior
Filipa (a emigra)
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