terça-feira, agosto 28, 2012

Divagações sobre o Tempo III


Rodeavam todas uma mesa estafada de esplanada. No seus trajes andrajosos de pessoas que já viveram muito e não vão em modas.
Aqueles padrões, ninguém lhes diz que já não se usam?
Isso e as permanentes, em cabelos detalhadamente penteados e pintados de louro platinado...
E estavam ali prostradas com todo o vagar do mundo, numa terra onde as ondas de calor se conseguem ver a emergir dos paralelos do passeio. Jogando conversa fora, avaliando a sua solidão, comprando pão de manhã num ritual interminável.
A vida sendo simples, simplificando-lhes o espírito.

***
Vagueava então nessa sensação de que devia estar a fazer algo, embora não houvesse realmente nada para fazer. Nada para além da espera.
A espera dos dias, que se transformam em horas e horas que ganham significado físico a cada minuto que passa.

***

Nesse vagar, nesse torpor tépido do estio, de olhos bem abertos, espírito crítico e aguçado, tudo ganhava então outra dimensão.
Esses pormenores da interioridade, todas essas coisas para além do verde das colinas e do silêncio das tardes.
Essa falta de mundo, e no entanto, ali estava um mundo inteiro, tamanha contradição.

*** 
O tédio que se instalava por vezes em si era medonho. Porque era um tédio paralisante, negativo. Daqueles tédios que nos impedem de pensar, de agir. E todos os nossos sinais vitais se reduzem a uma respiração pausada, um suspiro profundo.
Devia estar a fazer alguma coisa, embora não haja realmente nada para fazer…

*** 
Pelas pedras da calçada continuam, em movimentos lentos, pessoas que sobem e descem a rua principal. Ou o que resta dela. Ruinas caídas, montras estagnadas, rostos vazios por detrás de balcões tantas vezes encerados.
Nesse torpor do estio, para onde vão todos? Sentar-se num qualquer banco de jardim e ver a vida passar?

*** 

Nem uma aragem, nem ponta de fresco, só esse ar parado, essa atmosfera pesada. Essa opressão que não nos permite pensar.
E o silêncio. Esse silêncio entrecortado amiúde pelos ruídos da cidade. Um carro que passa trepidante na rua de baixo, um latido arreliado ao longe, um grito abafado de criança que perde a bola num movimento menos pensado.
As portas fechadas, pessoas encerradas em quatro paredes largas, protegendo-se do calor, fechando nessa garrafa monumental o tédio da existência.

*** 
E subsiste essa sensação, essa angustia... essa quase certeza de que devíamos todos estar a fazer qualquer coisa…embora paire no ar essa sensação de que simplesmente não podemos fazer mais nada....



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