Era meio da manhã, o sol era quente mas não impiedoso. Era
já Setembro e a brisa refrescara trazendo prenúncios de um Outono ainda
distante.
Encostavam-se todos ao balcão de mármore branco, encardido
pelo tempo e pelos copos de tinto.
O salão era amplo. Nunca teria sido bonito, mas sim o possível
de se fazer. O gosto duvidoso da mistura de azulejos de fim de linha, a
magistral lareira reinando sobre a sala, trono que os actuais Lcd’s queriam
roubar, a cor ocre das paredes, os alumínios usados das janelas.
As cadeiras e mesas de café em ferro, de pés mancos sempre a
entornarem os copos a quem se atreve a colocar os cotovelos em cima do tampo.
Todo esse cenário envolto numa névoa do tempo e fumo só perceptível
depois de se entrar pela cortina de fitas.
Tudo parou ali.
Os homens sorvem o café com um cheirinho, sorriem abertamente
num triste cenário de dentes podres e tabaco e as senhoras, oscilam o seu peso
pelas cadeiras no ócio da manhã.
O trânsito lá fora é irregular, as casas dispersas, o mundo
ritmado pelo som das notícias na televisão.
Os campos estão vazios, os tractores encostados, as festas
de Agosto acabadas, os emigrantes retornados para longe.
Nada mais a fazer.
No ócio do tempo, no aborrecimento da existência, nesse
tédio de coisas que não se tem para fazer se perderiam todos por ali. Deitando
conversa fora, falando de um mundo conhecido pelo telejornal, dizendo lugares comuns.
Falariam depois da vida dos outros, queixaram-se da sua própria vida até que o
sol do meio-dia os chamasse para um desejado almoço.
Esse cenário, num ápice aparecendo aos olhos dos
forasteiros. Aqueles que encostam no tasco à beira da estrada para um café
salvador do marasmo da condução por estradas secundárias feitas de pisos novos
e vazias. Daquelas que atravessam grandes extensões de mata, quilómetros e quilómetros
de solidão.
Essas estradas que nos levam de uma região para outras, onde
pequenos pormenores na vegetação ou nos hábitos das pessoas nos dizem que não
estamos mais onde estávamos.
Pensou de repente em todos esses sítios desconhecidos,
perdidos no mapa. Em todas essas pessoas cuja voz nunca se ouve, nem mundo profundo
onde as leis dos Homens são diferentes, onde as mulheres se eclipsam antes dos
trinta.
Fez-se silêncio à sua entrada. Pediu um café em voz baixa
que pareceu ecoar pelos recantos do salão em ondas de choque abissais. As cabeças
voltaram-se num silêncio profundo. Observaram o elemento estranho a si. Os
calções indecentes, a figura esguia e o esgar de espanto por estar tanta gente
naquele sitio e depois, como que por ordem divina, todos voltaram à sua vida
habitual ignorando o forasteiro. Falando alto, bebendo, rindo de algo
sem piada, simplificando a vida, vivendo-a ao segundo.
Segundos que se
transformam em minutos e depois horas, que todas juntas farão dias. Dias que
serão anos sem significado, passados no mesmo balcão de mármore que estará
apenas mais encardido da próxima vez que lá se parar.
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