sábado, janeiro 26, 2013

Ensaios I



O Silêncio. Um eco sem cor vibrando pela casa. Todos esses lugares comuns, o pó dos móveis e os papéis abandonados ao acaso.
O cheiro familiar, algo adocicado, misturado com o comer de ontem, perdido na memória do dia.
O escuro da luz neutra, baixa para não ferir os olhos. Tudo no silêncio da casa.
A sua casa, tão sua uns dias, outros completamente indiferente.

Não havia pronunciado uma palavra naquela semana. Foi como se as palavras fugissem de si, se escondessem num qualquer recanto da mente, se recusassem a formar as ideias que cresciam no seu ser.
Quedara-se num canto da casa na penumbra, olhando ao longe um fio fino de paisagem por uma nesga da janela.
E via, no chão de madeira o dia a passar, as horas marcadas por sombras. Dias radiosos de sol pelo brilho do soalho, aquele dia triste de chuva pela triste escuridão da casa.
Pensou que se esquecesse as palavras, se permitisse que elas se esvaíssem de si aqueles sentimentos que a atormentavam desapareceriam também na ausência de significado, na impossibilidade de tradução.
Esperou, inerte. Perdendo um som de cada vez, esquecendo os rabiscos no papel…havia uma semana que não dizia uma palavra.

Quando todas as palavras se perderam por fim, quando não havia mais código nem símbolos, nem formas de se explicar levantou-se por fim.
Aproximou-se da janela, abriu-a. Cheirou o ar e não soube a que cheirava. Nem conseguiu sorrir ao verde das colinas, ao azul do céu.
Não soube como explicar. Perdera as ideias tristes que havia dentro de si…mas sem as palavras perdera também a beleza dos dias.
Sentir nada pareceu-lhe então um horror maior do que sentir algo que ia doer…Não poderia viver em tamanha apatia.

Quedou-se então perante a janela aberta e lembrou-se de um som de cada vez, prenunciando-o ao vento. Esforçou-se pelas noites, contando as estrelas, dando-lhes nomes. Até que uma frase se formou,  depois um conceito, e o coração apertado criou a dor e o desgosto que vivia em si tornou vivo.

E ainda assim, doendo que estava a sua alma, cheirou o ar e cheirava a terra molhada pela geada da manhã, sorriu à beleza do verde das colinas e viu a aurora nascer, o milagre de um novo dia.
Pensou então na sua ingenuidade. 
Pior que sentir tamanho desgosto, é não sentir nada.

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