sexta-feira, março 21, 2014

“Frankly My dear... I don´t Give a Damn”


Lembro-me de que quando era pequena achava que a vida das pessoas não existia para além de mim. Um dia, numa das muitas vezes que o meu pai me foi buscar a casa da mãe, numa dessas viagens que começavam comigo a soluçar colada ao vidro do carro, vi-as a desaparecer no afunilar de uma rua. As suas vidas ficavam então inanimadas, inexistentes. Todos os seres funcionavam como figurantes do palco que era a minha existência. 

A fase egocêntrica. Eu no centro do mundo, o mundo dos outros a confluir no meu. Isso aconteceu quando eu tinha seis anos. 

 *** 

Enquanto crescemos apercebemo-nos da nossa insignificância no girar do mundo. Se eu desaparecesse todos os outros seres continuariam a respirar. A viver, não seriam inertes nem incapazes, a minha existência é tão só uma figuração na vida dos outros. 

O meu mundo, uma irrelevância. A inversão do princípio da nosso existência é um processo lento e doloroso. Escusamos-mos a aceitar que não somos especiais, nem únicos, nem sequer necessários. Somos peças. Somos até, salvo raras excepções, peças desnecessárias. 

Como formigas num formigueiro. Soldados, mantendo a engrenagem viva, ocupando espaço. Sendo um escudo. 

***

Quando eu digo que não gosto muito de pessoas, sei que às vezes sou mal interpretada. Adoro pessoas, as minhas pessoas. 

Depois há um mundo de pessoas que são um mar de angústia, de frustração de incógnitas e preocupações. As pessoas, na generalidade, as pessoas desconhecidas são más notícias. São difíceis de ler impossíveis de antecipar. 

As pessoas têm razões que a própria razão desconhece. As pessoas são difíceis. Às vezes gostava de ter de novo seis anos, gostava que a vida das outras pessoas se eclipsa-se no virar da esquina. Gostava de não ter de pensar no que elas vão a pensar para casa. O egocentrismo da infância, era então uma santa ignorância. 

*** 

E um dia estamos tão cansados desse jogo de leituras, de rostos e expressões. De expectativas. Das nossas por cumprir, das dos outros incumpridas. 

De nós esperando, dos outros à espera. Cansados de achar coisas, de esperar, as expectativas matam-me. 

Que só nos apetece dizer “Frankly my dear, I don´t give a damn”. 

E ansiar ser capaz de deixar de me importar de vez…

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