domingo, dezembro 30, 2012

Cadernos de viagem V




Nevou como não nevava há 45 anos. A cidade jaz literalmente debaixo de meio metro de neve. A vida passa a ser tudo menos fácil, quando se tem de "cavar" o caminho até casa... 

Ainda assim a vida prossegue, ao ritmo dos limpa-neves, das pessoas que com as suas pás limpam passeios e criam caminhos sobre o manto branco. 

Os carros patinam sobre a estrada, mas seguem cuidadosos para o seu destino e as artérias pulsam lentas, abrindo caminho, até voltaram ao normal, como num corpo que se atrofiou, sofreu um ataque cardíaco e agora luta para se recuperar.

Fora da cidade o manto branco possui os montes, as florestas e toma como suas as águas dos lagos, dos ribeiros que pararam de correr e se negam a chegar ao mar.

Florestas inteiras de pinheiros mansos, tristes sobe o peso do gelo, os seus ramos murmuram sons do norte. Sem pássaros, sem vida que se veja. Um silêncio polar. De uma beleza triste, se podermos encontrar beleza no desolamento, no frio gelado, na paz do silêncio, na ausência aparente de vida... 


A norte, nas pistas de Ski tremem luzes pelas montanhas mostrando caminho àqueles que se atrevem a descer nos fins de tarde gelados, aqueles que brincam e riem alto como se estivessem deitados na areia da praia. Ali, tudo aquilo, esse frio gelado, a ser ignorado... Menos dez, sensação térmica menos 15, totalmente intolerável a seres vindos do sul. 

O Sol surge alguns dias, forte, como se viesse reclamar um lugar que é seu. Surpreendente na sua intensidade, tão fugaz, tão inconsequente que o manto branco apenas brilha e se torna eterno debaixo dos nossos pés.

A falta constante de sol torna as pessoas pálidas, as ruas iguais na monotonia das cores. O branco predomina nos jardins, nos parques, nas feridas abertas na malha urbana, a vida pintada de branco e da neve suja das estradas, um contraste total ao conforto, à beleza sóbria e vivida do interior das casas. 

Depois da tempestade, do vento forte que varreu as ruas criando vagas brancas, esse mal soprado por um céu cinzento e ameaçador, acalmam-se os espíritos. Limpam-se os telhados que vergam com o peso do gelo. Passeia-se em cima de lagos gelados. 

Abraça-se essa condição, inverno intenso, penoso e suspira-se pelos meses que virão,anseia-se.


Sabemos já neste ponto da vida...depois da tempestade, virá a bonança. O melhor ainda está para vir.

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