Mudei-me para aqui, bem podia ter
sido para Marte, que eu à Lua ainda conheço as fases. Deste sítio nada. Só o lugar
que ocupa no mapa e o semblante visto ao longe, no cimo da colina.
Este sitio é como aquela pessoa
com quem toda a vida nos cruzamos na rua e nunca soubemos quem é. Dissemos-lhe
bom dia, boa tarde, um sorriso num dia de verão, mais nada.
Hoje subi a encosta a correr,
entrei na artéria principal e continuei pelo planalto, pelas ruas estreitas,
pelas vielas, pelo reino do gótico. Não conheces as ruas antes de lhes ter
pisado a calçada, antes de sentires a mistura do ar, do cheiro do jantar que se
desprende das casas ou do pão que torra no café. Esse cheiro da vivência que
envolve o das árvores, os escapes e a neblina que sobe do rio em fim de tarde.
Não conheces os sítios antes de
os sentires a pulsar, a vibrar debaixo dos pés antes de distinguires os sons, e
veres as esquinas, os sítios onde não foste mas podes ir.
Correr. Aqui, ou no outro lado do
Atlântico continua a ser a maneira mais fiel de conhecer uma cidade.
***
Estou a ressacar de pessoas.
Ainda que a rua esteja cheia de Humanidade, eu preciso de pessoas, das minhas.
De pessoas de quem eu não posso duvidar, de expressões conhecidas, de
gargalhadas altas e sinceras, de ter espaço e de ser eu. Eu entre os meus
pares, entre tantos anos de afinidades, de cumplicidade. Estou a ressacar das
minhas pessoas.
Aqui em Marte são todos
desconhecidos. Hoje vi esplanadas, achei-as interessantes, talvez me vá lá
sentar. Ai pensei nessa coisa complexa que é conhecer pessoas, da espontaneidade.
Antigamente isso era fácil, na escola ou nas noites de copos, o amigo que apresenta o
outro amigo, um mundo de tempo e possibilidades.
E agora, como se conhecem
pessoas? Como se descobre afinidades? Agora que a paciência é pouca, o tempo
ainda menos e a nossa exigência maior. Crescemos e não temos mais tempo para o
erro, não temos mais espaço para a desilusão, para escrutinar rostos ou desvendar
personalidades. Pisar terrenos movediços, pessoas. As pessoas são difíceis. E
como descobrir pessoas no meio de tanta Humanidade?
***
Depois conhecemos pessoas que têm
muros altos, são autênticas fortalezas. Um império solene, vivem na mais
perfeita solidão.
Que não nos permitem entrar, mas que nos convidam a espreitar cá de fora. Que embora nos mostrem a riqueza do
seu ser, nos emprestem por momentos a chave e nos deixem permanecer por
instantes, no fim do dia sempre vão encerrar as suas portas.
São normalmente encantadores.
Falam muito, comunicam pouco. Prendem-nos por momentos nessa áurea misteriosa. E
nós por instantes achamos que vamos conseguir entrar, estamos já apaixonados por esse admirável
mundo interior…presos. Porque são intensas, e saborosas tornam-nos insaciáveis...
Mas são fortalezas. Estão perpétuamente
encerradas.
Só nos resta a certeza que nunca se darão a nós, devemos parar antes que se tornem corrosivas.
Só nos resta a certeza que nunca se darão a nós, devemos parar antes que se tornem corrosivas.
Em tempos achei que queria ser assim,
auto-suficiente e inalcançável.
Não sei mais se quero. Conhecer
alguém e permitir que nos conheçam é um processo maravilhoso de criação de
laços.
Orgulhosamente sós…é com viver “La
grade Belleza”, freneticamente no agora.
Uma vida sem estória no meio de tantas
histórias.
Sem comentários:
Enviar um comentário