segunda-feira, março 10, 2014

A Síndrome da solidão.

Eu vivo sozinha. Esta é a minha casa. Ninguém me chateia eu não chateio ninguém. A minha família vive noutras cidades, ao longo dos anos os amigos mais chegadas foram indo embora, cada um para a sua vida, dispersando pelo mundo.

Embora eu conheça muita gente e tenha muitos e bons amigos, estou, na prática, sozinha. Aqui, em Portalegre ou em qualquer outro lado do mundo.

Isso não é um problema na maior parte do tempo. Sempre fui muito autónoma, há poucas coisas na vida que eu faço com os outros que não posso fazer sozinha, não morro de solidão, nem me aborreço, considero que tenho recursos e uma vida interior capaz de me entreter por muitos e bons dias.

Treino sozinha com a mesma vontade com que vou ao estádio treinar com a equipa, cozinho para mim como se tivesse de alimentar a família, saio e passeio, não fico em casa só porque não tenho com quem ir.
Não sou uma solitária, tenho amigos, convido-os a vir a minha casa, combino cafés, saímos para beber um copo, vamos a consertos. Eu vivo com outros, eles só não vivem na minha casa.
Eu vivo sozinha. [Ponto] Isso não é um problema para mim, parece às vezes ser para os outros.

Esta conversa porque no outro dia parti a cabeça, fiquei atordoada e não havia lá em casa  ninguém para ver se era grave, para me amparar na queda. Eu tenho dois telemóveis e três dispositivos ligados em permanência à internet, nunca estás virtualmente só, mas depois precisas de ir perguntar à farmácia do lado se se vê o cérebro ou se podes ir treinar.  Tudo bem, é o preço a pagar, como tudo na vida há prós e contras. Eu sei os contras, há que os contornar.

Mas isto deve ser socialmente estranho, digo. Se não, pelos vistos é algo que merece uma certa compaixão, porque “coitadinha, não tem ninguém que a venha cá buscar? Uma menina tão bonita…aiii diga lá, não têm um amigo?”

Quando me dizem que não devo ir sozinha a conduzir até ao hospital eu acho que devo chamar um táxi. Mas a Enfermeira continuou a insistir, que eu devia arrancar algum amigo do trabalho, chamar um ente querido do outro ponto do país ou quiçá mandar vir a minha mana do Canadá para me ver levar 3 pontos.
Eu tenho a certeza no meu coração que se precisa-se que alguém lá fosse bastava um telefonema, podia começar no topo da lista, mas é realmente necessário chamar alguém para fazer algo que eu posso fazer sozinha?

Porque é que alguém tem de perder meio-dia de trabalho quando com 3€ eu simplesmente pago um táxi?

Hoje confrontaram-me novamente com essa “doença” de que padeço. “ A sério, não tem ninguém que lhe possa ir lá receber o técnico?”  E de novo esse olhar de compaixão. “Coitada, não tem cá ninguém…pobre rapariga.”

Porque é que tomar decisões, fazer coisas e estar-se sozinha, sendo-se menina ou uma jovem mulher adquire em certos momentos essa aura de desgraça? Tenho de ser dependente de algo ou de alguém, preciso de alguma certificação social?

É assim tão estranho no mundo de hoje, um mundo em que estamos em constante rotação, entrando e saindo, mudando…

Parece então doença, uma síndrome. Uma daquelas coisas que não se sabe de onde vem e que nos afeta a nível funcional. Que não afetaria se todos fizessem o trabalho como esperado, às horas planeadas.

Se não houvessem expressões de desapontamento, nem olhares de pena.

Não, não sofro de autocomiseração. Estou aqui sozinha. Isso é diferente de estar aqui solitária!


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