segunda-feira, maio 12, 2014

"Tem que doer, pois se não doer como sabemos que estamos vivos (Apeles)"

"I assess the power of a will by how much resistance, pain, torture it endures and knows how to turn to its advantage. " Friedrich Nietzsche




Doí sempre. Doí porque estás bem e queres fazer o teu melhor e doí porque não estás preparada e queres chegar ao fim, nem que seja de rastos.

Doí-te quando sentes que não tens mais espaço no peito para respirar ou quando o teu coração se transforma numa bomba em sobreaquecimento pronta a rebentar.

Doí enquanto sentes as pernas, doí-te quando ficam tão dormentes que já não dás passos e apenas tens espasmos que numa impossibilidade técnica te continuam a impulsionar para a frente.

Correr uma meia maratona dói. [ponto]

Não tem uma explicação. Quem não corre não pode entender, porque não tem explicação.

Como explicar a alguém que podes simplesmente ultrapassar o limiar da dor porque não queres desistir?

E que cada passo que dás em direção à meta é uma pequena vitória interior.

Como explicar que as conversas que tens contigo mesma, a análise, todo esse tempo é um espaço de auto-conhecimento e reflexão inesgotável, que acabas sempre melhor do que começaste…mesmo que pareças um farrapo?

Não sou grande atleta. Não tenho nem tempo, nem disponibilidade para o ser. E existe um lado hedonista do meu ser que, para além de correr, gosta de um outro tipo de boa vida. Ou de má, depende sempre de como a estamos a viver. Se não dormes  o suficiente, se não comes com tino, se vais bebendo coisas para além da água, se vives… corres, mas não corres a mesma conta.

Mas tudo isso não me fatiga o espirito, nem a prova em si, o aparato de domingo, não é o que me fascina. Faço-o porque é estimulante e porque corres com outros, alargas outros horizontes. Conheces cidades e serras. 

Conheces cidades que despem as avenidas de carros para te receber. Numa perspetiva completamente diferente dos espaços e do pulsar das artérias. Vais a sítios onde não irias, e essa descoberta exterior é também um desafio aos sentidos. Nas serras, os cheiros a mato, a erva molhada pela manhã nas provas de trail, ou ao bafo salgado das vertentes que estendem junto ao mar.

Seja onde for, é sempre uma overdose para os sentidos. É sempre uma sensação de se estar viva para além do torpor dos dias. E de superação.

Por isso sofres, porque nessa balança de equilíbrio delicado ganhas sempre mais do que o que perdes. Não desistes porque a frustração de não acabar é mais difícil de aguentar do que aquela dor estupida que se te meteu nos joelhos.

E mesmo que te falte tudo, na via sacra dos últimos quilómetros, te falte hidratação, te falte a alimentação, que te falte a energia, nunca te falta o coração.

Cada meta atingida é uma vitória íntima.


Não se explica, não sei explicar isso a ninguém.

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