Moro no 3ª andar, subo e desço
sempre pelas escadas apesar de haver elevador. Pressinto que os vizinhos acham que
é uma forma de ser antissocial e de os evitar naquele cubículo abafado, eu acho
que não faz sentido nenhum correr 10kms ao fim da tarde e depois ir de elevador
até casa.
***
Lembro sempre da minha janela com
vista para a serra, o ar fresco de fim da tarde, o suão quente e seco no topo
do verão e o silêncio das ruas a ecoar na calçada. Esse silêncio diferente em
cada sítio onde se mora. Em Portalegre sepulcral, cheio de ecos das encostas e
pequenas especificidades das casas de portas abertas diretamente para a rua. O
silêncio dos passos que batem pela noite dentro nas ruas vazias, das gritarias
estudantis do fim do Setembro logo após a sensação de total esquecimento que é Agosto.
Em Grândola o silêncio é um
silêncio fresco que cheira a brisa longínqua de mar. A vento salgado a girar
nas copas das árvores, gritando por vezes debaixo de um céu negro e estrelado.
O cheio a terra, a pó. A rebanho de ovelhas e as cigarras que gritam com os
cães a perderem-se em ecos pela imensidão daquele noite plana. O silêncio de Grândola
é um silêncio ancestral.
Aqui o silêncio é um silêncio de
sombras que passam nas janelas. De roupa que oscila no sétimo andar. De cadeiras
que se empilham no bar da esquina ás 10h da noite e de carros que travam nos
cruzamentos na madrugada de quem está a chegar depois da noite virada a trabalhar.
E um silêncio ambíguo, porque se
ecoa nas larguezas da Lezíria depois afunila numa promessa de civilização.
Nestes silêncios podes sentar-te
ao fresco, sem nada ouvir e ouves sempre um pulsar, os sítios respiram cadenciadamente,
como se tivesse corações que batem, sangue a correr nas artérias e principalmente,
uma alma.
É essa alma por que nos
apaixonamos, essa alma só se encontra no “silêncio”.
***
São então as trivialidades que
fazem de um sítio casa. O cheiro, o primeiro que sentes quando colocas a chave
na porta da rua e pões o pés no o teu hall de entrada, o cheiros que vais encontrando
andar a andar, a cada degrau adivinhando o jantar do vizinho, ou o cão angustiado
que o dono não levou à rua, o tipo que colocou o lixo à porta. O perfume
intenso da vizinha que vai sair, o cheiro a riso juvenil da malta de baixo que
está a fazer um jantar.
***
O cheiro e o som do silêncio.
Quando amares os que sentes, estás em casa.
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